Meu Pé de Laranja Lima

Meu Pé de Laranja Lima
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Filme baseado no livro homônimo de José Mauro de Vasconcelos.  Apesar de haver uma versão mais recente, recomendo o filme de 1970, dirigido por Aurélio Teixeira. E por que? Porque esse filme, apesar de tão antigo, deveria ser visto e revisto por todos. E o livro deveria ser lido e relido. Apesar da produção simples e sem grandes recursos (afinal é da década de 70), esse filme consegue transmitir toda a pureza e melancolia do menino Zezé.

O filme mostra a história de uma família extremamente pobre. Mas o que mais falta a eles é carinho. São pessoas sofridas, amarguradas, que parecem ter perdido a capacidade de demonstrar afeto. Porém um dos filhos, Zezé, se recusa a viver assim. Quando a família se muda para uma casa com quintal, Zezé, com uma imaginação riquíssima, acredita conversar com o pé de laranja lima. Esta árvore se torna sua amiga, confidente e refúgio.

Zezé também inicia uma amizade com um homem que ele chama de “Portuga”, que tem uma espécie de função de figura paterna em sua vida, já que seu pai, desempregado, torna-se carrancudo e não interage com os filhos, ou quando o faz é com agressividade e aspereza. Zezé encontra no pé de laranja lima e nesse estranho toda a doçura e apoio que a família não lhe traz.

O enredo do filme (e do livro) é simples. Uma família que passa por dificuldades e um filho que se apega a uma árvore e a um amigo para conseguir ser mais feliz. O que faz com que seja tão tocante é a ideia de ver o mundo através dos olhos de uma criança. Zezé transforma sua realidade pelo modo como decide enxergá-la.  Para ele, tudo é mágico. Nesse ponto, ele se assemelha a outra personagem já descrita por mim, em uma resenha anterior: Anne, de Anne with na E. Os dois têm vidas extremamente difíceis, experimentam a solidão e a falta de empatia e de cuidado por parte dos adultos que os cercam. Eles conseguem se rebelar contra essas condições. Mas não é uma rebeldia ríspida: em um mundo onde parece imperar a falta de amor, a visão deles e a forma como encaram a vida, usando a imaginação para colorir a realidade, é um ato corajoso e que parece ser uma habilidade que não muitas pessoas possuem.

Ao longo do filme, acontecem situações que levam pessoas mais sensíveis a chorar, e muito. Zezé parece não conseguir impedir que a realidade o atinja. Por mais que se esconda em seu mundo de fantasia, o mundo real cobra a conta, mesmo de uma criança. Zezé sofre, por exemplo, uma agressão do pai, que lhe dá uma surra porque o menino canta uma música “indecente”. Porém, sem maldade nenhuma, Zezé apenas canta porque gostou da melodia, ele não entende a letra. E assim a história continua, com Zezé sofrendo e amadurecendo precocemente.

Faço então dois convites: um é para que todos vejam esse filme, em sua versão de 1970. O outro é para que se perguntem, dentro de si: vocês possuem um pé de laranja lima? Conseguem fazer da realidade algo mais doce e ver graça e poesia nas pequenas (mas singelas) coisas? Conseguem ser um pouco o Zezé do início, com imaginação e coragem? Ou são um  Zezé quebrado pelo mundo real?

 

Raquel Andrade

Raquel Andrade é graduada em Letras (UFMG) , tendo cursado um semestre na Wayne State University (Michigan, Estados Unidos), onde estudou literatura e cinema. Mestre em Literatura (UFOP), dissertou sobre o livro “O Morro dos Ventos Uivantes”, de Emily Brontë, e três adaptações deste romance. Já lecionou idiomas em várias escolas e atualmente é autônoma, ainda trabalhando com ensino de línguas e tradução. Traduziu um conto de Hemingway e já realizou tradução consecutiva, entre outros trabalhos. Apaixonada por livros, séries, filmes e tudo que envolva a sétima arte.

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